"Diferentes grupos de pessoas contribuem para a construção da sociedade de diferentes maneiras. Essa diversidade carrega um significado especial para a estrutura social como um todo. Se a diversidade não houvesse existido, a sociedade humana não teria avançado nem mesmo até a Idade da Pedra, que se dirá do presente estágio de civilização.

Portanto devemos considerar e apoiar imparcialmente todas as diversas idéias, formas e cores que conduzem ao fomento do crescimento pessoal e desenvolvimento social entre os seres humanos. Se falharmos nisso, aquela parte da sociedade que foi construída em torno de uma idéia, forma ou cor particular irá definhar e morrer.

Eu dirijo isso não apenas àqueles que pensam profundamente sobre o bem-estar social, mas a todos os membros da sociedade, para incutir neles que ninguém, através de seus pensamentos, palavras ou acções, jamais deverá tolerar a injustiça."
P. R. Sarkar

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

PORTUGAL É A GRÉCIA QUE SE SEGUE ! !


    Europa está no caminho errado, porque a sua receita para a crise da dívida soberana, a chamada consolidação orçamental expansionista, é um paradigma económico que falhou. 
    O pensamento foi que demitir funcionários públicos e corte de gastos do governo eliminaria o défice orçamental em países como a Grécia e Portugal e, portanto, restaurar a confiança do mercado em sua dívida soberana. A realidade acabou por ser um pouco diferente. Em vez de cargas de endividamento, estamos presenciando maior carga de dívida pública e cortes no crédito ao setor privado. Se a Europa continua neste caminho, a zona euro vai quebrar totalmente com imprevisíveis repercussões políticas e econômicas.
    A Europa está  errada em se concentrar em déficits orçamentários, pois o maior problema é o endividamento privado. Em Portugal, o Governo adoptou medidas de austeridade íngremes, como condição de seu pacote de ajuda. No entanto, a economia do país vai agora diminuir porque os decisores políticos europeus não compreendem a dinâmica de deflação da dívida. 
    O que falta entenderem é que o setor privado Português é altamente endividado. O resultado, então, de cortes do governo ou aumento de impostos quando o sector privado está em dívida e a economia está paralisada é a deflação da dívida, e a  ameaça da falência devido à diminuição da produção  económica.
     A Europa deve entender que a Grécia não é um caso especial. Pelo contrário, é a ponta de uma deflação da dívida, que corre o risco de atingir Portugal .  Dito cruamente, Portugal é a Grécia que se segue !
    Para seu crédito, as agências de classificação e do Fundo Monetário Internacional têm todos revelado  inquietação  com esta resposta política na Europa. Na verdade, em cada uma das últimas rodadas de classificação rebaixamentos de crédito soberano, a Standard & Poors e Moody, escreveu que tinha descido  vários países da Europa, em parte, porque a abordagem centrada na austeridade foi tornando as coisas piores. As agências de classificação indicaram que a Europa deve voltar-se para mais políticas pró-crescimento  para ter alguma esperança.
    A linha inferior é esta: a Europa está fixado no problema errado, os défices orçamentais. O maior problema na maioria da Europa é o endividamento privado e alavancagem do setor financeiro. Se a Europa quer resolver seus problemas, ele deve resolver esse endividamento, e isso exige muito mais do que intermináveis ​​rodadas de austeridade fiscal e corte no orçamento.
    (Edward Harrison - especialista bancário e financeiro  e "Advisor" ).

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

POR QUE A DOUTRINA DE MERKEL ESTÁ TOTALMENTE ERRADA!


«A doutrina Merkel parte do princípio que a crise resulta da irresponsabilidade dos governos e, assim, apenas uma regra “dura” sobre o orçamento pode evitar que estas crises voltem a acontecer.

Mas a análise de Merkel está totalmente errada. Não foram os défices excessivos que provocaram o colapso económico de 2007 e 2008 mas sim a excessiva concessão de créditos por parte do sector bancário. O aumento das dívidas públicas foram uma consequência da recessão económica e não a sua causa. O que deveria ter sido integrado na estrutura institucional da União Europeia era uma regulação financeira mais dura e não uma austeridade orçamental permanente. E tem havido poucos sinais no sentido de endurecer a regulação financeira.

Para já o mais importante é o falhanço da “união orçamental” na recuperação europeia. Os números são desanimadores: antes da cimeira, o Banco Central Europeu baixou a sua previsão de crescimento do PIB da Zona Euro em 2012 de 1,3% para 0,3%. Uma estimativa optimista. De facto, a Zona Euro vai contrair-se na primeira metade do ano – e provavelmente na segunda, devido às medidas de austeridade que estão a ser aplicadas – aumentado a pressão sobre os bancos e as dívidas soberanas.

A razão para a recuperação do crash de 2007 e 2009 ter sido tão anémica é simples. Quando uma economia diminuiu, a dívida pública aumenta automaticamente, porque as receitas caem e os gastos aumentam. Quando se cortam os gastos, a dívida cresce ainda mais, porque os cortes provocam uma nova contracção da economia. Assim aumenta, e não diminui, a probabilidade de um governo entrar em incumprimento.

Na Zona Euro, a maioria da dívida pública é detida por bancos privados. À medida que esta dívida aumenta, o valor dos activos dos bancos diminui. Ou seja, a crise da dívida soberana afecta os bancos. Ao submeter os governos debilitados a um racionamento férreo, como Merkel fez, tornou a crise financeira inevitável. Continuar a defender a salvação através da austeridade, à medida que a economia abranda e os bancos colapsam, é repetir o erro clássico do chanceler alemão Heinrich Brüning em 1930-1932.

Desde logo, a Zona Euro precisa mais do que um resgate. A periferia precisa de recuperar a competitividade e alguns ficaram animados com a redução dos défices comerciais dos países do Mediterrâneo – os desequilíbrios comerciais estruturais dentro da Zona Euro estão a corrigir-se, argumentam. Infelizmente, estas correcções não resultam de um aumento das exportações mas da queda das importações, consequências dos reduzidos níveis de actividade económica.

A ideia de que um país pode alcançar um excedente orçamental não importando nada é tão extravagante como a ideia de que um governo pode pagar a sua dívida sem receitas. O gasto de uma pessoa é o rendimento de outra. Ao insistir que os seus parceiros comerciais devem reduzir os gastos, Merkel está a cortar uma das suas principais fontes de crescimento.

Assim, conseguirá a moeda única sobreviver? Duas políticas, que em conjunto, podiam salvar o euro estão fora da agenda. A primeira é a emissão de moeda (flexibilização quantitativa) a uma escala heróica. O Banco Central Europeu deveria ter o poder de comprar o montante necessário de obrigações gregas, italianas, espanholas e portuguesas que permitisse baixar os juros da dívida destes países para o nível da alemã. Isto poderia estimular o crescimento real através de vários caminhos: reduzindo as taxas de juros dos empréstimos, aumentando o valor nominal dos activos públicos e privados e enfraquecendo o euro face ao dólar e outras moedas. 

Mas os efeitos de uma flexibilização quantitativa na actividade económica são incertos e, tal como uma política inflacionista, poderia provocar retaliações por parte dos parceiros comerciais da Europa.

É por isso que a flexibilização quantitativa deve ser aplicada em conjunto com um programa de investimento à escala da Zona Euro destinado a modernizar as antigas infra-estruturas do sul e do leste da Europa. Os gastos de capital dos governos, ao contrário dos gastos correntes, podem ser auto-financiados através dos utilizadores. Mas mesmo que não sejam, uma política de investimento bem escolhida produz retornos elevados: novas estradas reduzem os custos de transportes e novos hospitais geram uma força de trabalho mais saudável.

Já existe uma instituição, o Banco Europeu de Investimento, para aplicar este programa. Deveria ser recapitalizado numa escala que permitisse anular os efeitos contraccionistas do para dos programas nacionais de redução do défice.

A flexibilização quantitativa, em conjunto com o investimento público, poderia gerar o crescimento económico que a Zona Euro, urgentemente, necessita para reduzir, gradualmente, o peso da dívida. Mas é quase certo que nenhuma destas políticas, e muito menos as duas, vai ser implementada.


O Banco Central Europeu tem comprado, discretamente, obrigações no mercado secundário mas o novo governador, Mario Draghi, já garantiu que esta intervenção é temporária, limitada e visa apenas “repor o funcionamento dos canais de transmissão.»



(Robert Skidelsky,  professor e Economia Política na Universidade de Warwick. 
Fonte: 
Jornal de Negócios, em 22 de Dezembro)

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

O PAÍS DOS PIEGAS


«Era um país de piegas. Todo inteiro. Ou quase todo. Os velhos viviam na tremenda pieguice de sobrevivência com pensões descaradamente piegas.
Os jovens, muitos dos quais depois de anos e anos de estudo, eram uns pieguinhas. Sai do secundário, entra na faculdade, sai da faculdade, olha o desemprego, espera, tiveste sorte, olha aqui uma bolsita, lá se acabou a bolsa.
Terás casa um dia, por enquanto deixa-te de pieguices que não é vergonha nenhuma viver de mesada na casa dos pais aos trinta e tal anos! Os menos jovens caíram nessa pieguice de correr para os centros de emprego. Nada, você é velho de mais. Aos 50? Claro. Espere! O subsídio já terminou, e agora? Pieguices… Outros trabalham que nem uns mouros ou que nem uns cães. Ou como outra pieguice qualquer.
E o dinheiro não dá. Conta da água, da luz, do gás, dos transportes, da comidinha para o tacho, uma roupita de vez em vez. Pieguices! Pieguices, pieguices! E há os que vão ficando sem casa. Despejado! Piegas! E os que choram às escondidas enraivecidos por já não conseguirem pagar os estudos da filha que foi para Coimbra tentar ser doutora e agora está de volta a casa. O que vai ser dela? Não dizíamos? Piegas!
E há aquela senhora, toda bem posta, a descaradona, que na bicha da caixa do supermercado ao olhar para a conta, confessou baixinho: “afinal não levo a carne nem o azeite. Ainda tenho… Ai esta minha cabeça!” Uma piegas e mais a mais dissimulada! E a outra a quem cortaram a luz, bem feito não pagou, queria o quê?, vivia acima das possibilidades! E ainda se arma em piegas.
Um país de marinheiros e de poetas, foi acima que nos ensinaram! Mentira! Tudo mentira! Mas também agora não adianta chorar por isso ou ter outras manifestações de pieguice. Um país de piegas, isso sim. Decretou assim o senhor e assim é e tem de ser. Também decretou que não há carnaval. Era uma pieguice pegada, os pobres a fazerem de ricos e além do mais uma pouca-vergonha, com trocas de papéis, de sexo e tudo.
Portugal, este país de piegas, onde todos têm língua comprida que sem pieguice ainda hão de morder – é esta a nossa amada pátria aos olhos de um fulano que um dia por sorte ou azar do destino – pieguices da história – se tornou no primeiro capataz de serviço daqueles senhores que nos tramam e nos governam e que não conhecemos a não ser por uma alcunha – troika.
Aos senhores da troika só mesmo uns pieguinhas do caraças estão interessados em chatear. E vai-se a ver e os pieguinhas vão encher no próximo sábado até abarrotar de lamúrias aquele terreiro da capital que garantem não ser do Passos mas do Povo.
Um país de piegas?! Não há pachorra!»
( Francisco Queirós )

domingo, 5 de fevereiro de 2012

OS JOVENS SÃO MENOS SOLIDÁRIOS ?

No inquérito, realizado no âmbito do barómetro sobre a qualidade da democracia, pede-se aos entrevistados que identifiquem os grupos sociais que estarão a atravessar maiores dificuldades nesta crise. Para o efeito são propostas três afirmações sobre as pessoas mais ricas, as da classe média e as mais pobres e é pedido que as classifiquem numa escala de 1 (muito de acordo) a 5 (muito em desacordo). 

Confrontados com a afirmação de que "as pessoas mais pobres estão a viver tempos muito difíceis, porque não têm acesso às recompensas dos ricos e são pouco apoiadas socialmente", 82% dos entrevistados mostraram a sua concordância. Mas, segundo os autores do estudo, os sociólogos Filipe Carreira da Silva e Mónica Vieira, os resultados mostram também que, numa amostra de 1027 inquiridos, seleccionada para ser representativa da população nacional, são os mais jovens que manifestam o maior desacordo em relação àquela afirmação. 

Entre empregos precários e o desemprego crescente, "os jovens têm pela frente uma vida de enormes incertezas. Estão muito preocupados com eles próprios e daí a menor solidariedade com os pobres", justifica Filipe Carreira da Silva. Por outro lado, terão receio de que os apoios hoje garantidos aos mais pobres contribuam para o fim, a prazo, da existência das prestações sociais, os que os penalizará ainda mais.

Norte é diferente

Depois dos jovens, os que mostram menos solidariedade com as dificuldades sentidas pelos mais pobres são os inquiridos de menor estatuto social. Os autores do estudo lembram uma tendência que tem sido constatada em muitos inquéritos nacionais e internacionais: a maioria das pessoas tende a identificar-se como sendo da classe média, mesmo que tal não corresponda à realidade. Este autoposicionamento subjectivo justificará em parte, acrescentam, o facto de os inquiridos com menor estatuto social terem dado pouco peso às dificuldades dos mais pobres, "que serão muito possivelmente análogas às suas". "Fazê-lo seria em muitos casos equivalente a pôr a descoberto uma pobreza escondia", frisam.

Os resultados globais do inquérito mostram que a maioria dos portugueses discorda que os ricos estejam também a atravessar tempos difíceis. Já pelo contrário 70% considera que a classe média está a sentir particulares dificuldades "porque não tem acesso às recompensas dos ricos nem às prestações sociais", sendo, a seguir aos pobres, o grupo mais afectado pela crise. Esta percepção nacional não é seguida pelos inquiridos residentes no Norte litoral do país. Uma análise dos resultados por região revela que esta "é a única do país em que as pessoas não pensam ser os pobres quem está a passar por maiores dificuldades neste contexto de crise", elegendo em seu lugar a classe média. Os autores lembram, a propósito, que o Norte foi a região do país que mais empobreceu nos últimos anos.

A dissonância revelada nesta região coloca-a, no entanto, a par do padrão verificado na Grã-Bretanha. Um inquérito realizado em 2009, que serve de comparação aos autores do estudo português, mostra que 79% dos britânicos considera que é a classe média a principal vítima da crise actual. Já a percentagem dos que pensam que esta posição é ocupada pelos mais pobres desce para 59%, um valor muito inferior ao registado em Portugal. "Ao nível dos valores é uma sociedade muito diferente da portuguesa e as opiniões dos britânicos são o reflexo também do país que emergiu das reformas ultraliberais de Margaret Thatcher. Existe a convicção de que a economia de mercado deve gerar desigualdades, premiando o mérito e a procura de oportunidades", afirma Mónica Vieira. O inquérito realizado em 2009 reflecte essa postura: muitos dos entrevistados não só responsabilizam os mais pobres pela situação, como se dizem convictos de que estes fazem um uso indevido das prestações sociais que recebem. Mas as diferenças no modo como os portugueses e os britânicos encaram os mais pobres têm também como ponto de partida uma percepção quase radicalmente oposta do país em que vivem. 

Portugueses sem esperança

Ambos países têm em comum o facto de estarem no pódio dos mais desiguais no que respeita à diferença de rendimentos auferidos pelos mais ricos e pelos mais pobres. Mas enquanto na Grã-Bretanha, mesmo já em plena crise, só 26% dizem não acreditar "que existam oportunidades suficientes para que pessoas de todas as origens sociais possam subir na vida", em Portugal esta percentagem sobe para 58%. 

Para Mónica Vieira, o facto de mais de metade dos portugueses não acreditar na mobilidade social é um factor de "desesperança" e reflecte a experiência de vida num país em que as oportunidades de empreso continuam a surgir sobretudo, "através de redes de informação privilegiadas". "Portugal é uma sociedade ainda muito hierarquizada, diferenciada e clientelar", constata. 

A investigadora lembra que, sobretudo na década de 1990, houve um período de expectativa de ascensão social, que foi também potenciado pelo acesso de muito mais estudantes ao ensino superior. Mas agora nem os licenciados têm emprego, "os pais começam a sentir vergonha do legado que deixam aos filhos" e o que sobressai do país é a sua "desigualdade profunda e estrutural". "Há um sentimento de incredulidade na sociedade portuguesa. As pessoas ainda se estão a interrogar como é que isto nos aconteceu", acrescenta Mónica Vieira.

Se não vivida do mesmo modo, esta é uma fase que de todo já pertence ao passado na Grã-Bretanha, o que também poderá ajudar a compreender o diferente padrão das respostas de portugueses e britânico, adianta Filipe Carreira da Silva. "Quando Margaret Thatcher começou a desmantelar o serviço nacional de saúde, nos anos 80, estávamos nós a construir o nosso. Em Portugal é a primeira vez que se pensa em reformar o Estado social, o que leva a que crise seja sentida de modo diferente", afirma.


(Estudo do Instituto de Ciências Sociais (ICS) sobre as atitudes dos portugueses perante a desigualdade e os chamados direitos sociais, desenvolvido com base num inquérito realizado em 2011,  edição de o Público de 05/02/2012)

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

ACERCA DE PORTUGAL: O EMINENTE DEFLAGRAR DE CONVULSÕES SOCIAIS !


 " Portugal atravessa um dos momentos mais difíceis da sua história que terá que resolver com urgência, sob o perigo de deflagrar crescentes tensões e consequentes convulsões sociais."

« Importa em primeiro lugar averiguar as causas. Devem-se sobretudo à má aplicação dos dinheiros emprestados pela CE para o esforço de adesão e adaptação às exigências da união.


Foi o país onde mais a CE investiu "per capita" e o que menos proveito retirou. Não se actualizou, não melhorou as classes laborais, regrediu na qualidade da educação, vendeu ou privatizou mesmo actividades primordiais e património que poderiam hoje ser um sustentáculo.


Os dinheiros foram encaminhados para auto-estradas, estádios de futebol, constituição de centenas de instituições público-privadas, fundações e institutos, de duvidosa utilidade, auxílios financeiros a empresas que os reverteram em seu exclusivo benefício, pagamento a agricultores para deixarem os campos e aos pescadores para venderem as embarcações, apoios estrategicamente endereçados a elementos ou a próximos deles, nos principais partidos, elevados vencimentos nas classes superiores da administração pública, o tácito desinteresse da Justiça, frente à corrupção galopante e um desinteresse quase total das Finanças no que respeita à cobrança na riqueza, na Banca, na especulação, nos grandes negócios, desenvolvendo, em contrário, uma atenção especialmente persecutória junto dos pequenos comerciantes e população mais pobre.


A política lusa é um campo escorregadio onde os mais hábeis e corajosos penetram, já que os partidos cada vez mais desacreditados, funcionam essencialmente como agências de emprego que admitem os mais corruptos e incapazes, permitindo que com as alterações governativas permaneçam, transformando-se num enorme peso bruto e parasitário. Assim, a monstruosa Função Publica, ao lado da classe dos professores, assessoradas por sindicatos aguerridos, de umas Forças Armadas dispendiosas e caducas, tornaram-se não uma solução, mas um factor de peso nos problemas do país.


Não existe partido de centro já que as diferenças são apenas de retórica, entre o PS (Partido Socialista) e o PSD (Partido Social Democrata), de direita, agora mais conservador ainda, com a inclusão de um novo líder, que tem um suporte estratégico no PR e no tecido empresarial abastado. Mais à direita, o CDS (Partido Popular), com uma actividade assinalável, mas com telhados de vidro e linguagem publica, diametralmente oposta ao que os seus princípios recomendam e praticarão na primeira oportunidade. À esquerda, o BE (Bloco de Esquerda), com tantos adeptos como o anterior, mas igualmente com uma linguagem difícil de se encaixar nas recomendações ao Governo, que manifesta um horror atávico à esquerda, tal como a população em geral, laboriosamente formatada para o mesmo receio. Mais à esquerda, o PC (Partido comunista) menosprezado pela comunicação social, que o coloca sempre como um perigo latente e uma extensão inspirada na União Soviética, oportunamente extinta, e portanto longe das realidades actuais.


Assim, não se encontrando forças capazes de alterar o status, parece que a democracia pré-fabricada não encontra novos instrumentos.


Contudo, na génese deste beco sem aparente saída, está a impreparação, ou melhor, a ignorância de uma população deixada ao abandono, nesse fulcral e determinante aspecto. Mal preparada nos bancos das escolas, no secundário e nas faculdades, não tem capacidade de decisão, a não ser a que lhe é oferecida pelos órgãos de Comunicação. Ora e aqui está o grande problema deste pequeno país; as TVs as Rádios e os Jornais, são na sua totalidade, pertença de privados ligados à alta finança, à industria e comercio, à banca e com infiltrações accionistas de vários países.


Ora, é bem de ver que com este caldo, não se pode cozinhar uma alimentação saudável, mas apenas os pratos que o "chefe" recomenda. Daí a estagnação que tem sido cómoda para a crescente distância entre ricos e pobres.


A RTP, a estação que agora engloba a Rádio e TV oficiais, está dominada por elementos dos dois partidos principais, com notório assento dos sociais-democratas, especialistas em silenciar posições esclarecedoras e calar quem levanta o mínimo problema ou dúvida. A selecção dos gestores, dos directores e dos principais jornalistas é feita exclusivamente por via partidária. Os jovens jornalistas, são condicionados pelos problemas já descritos e ainda pelos contratos a prazo determinantes para o posto de trabalho enquanto, o afastamento dos jornalistas seniores, a quem é mais difícil formatar o processo a pôr em prática, está a chegar ao fim. A deserção destes, foi notória.


Não há um único meio ao alcance das pessoas mais esclarecidas e por isso, "non gratas" pelo establishment, onde possam dar luz a novas ideias e à realidade do seu país, envolto no conveniente manto diáfano que apenas deixa ver os vendedores de ideias já feitas e as cenas recomendáveis para a manutenção da sensação de liberdade e da prática da apregoada democracia.


Só uma comunicação não vendida e alienante, pode ajudar a população, a fugir da banca, o cancro endémico de que padece, a exigir uma justiça mais célere e justa, umas finanças atentas e cumpridoras, enfim, a ganhar consciência e lucidez sobre os seus desígnios. »

(Um artigo de Jacques Amaury, sociólogo e filósofo francês, professor na Universidade de Estrasburgo).